As questões de 01 a 03 se referem ao Texto I Texto I O gênero da ciência ou sobre silêncios e temores em torno de uma epistemologia fem...
As questões de 01 a 03 se referem ao Texto I
O gênero da ciência ou sobre silêncios e temores em torno de uma epistemologia feminista
“Elas recebem menos convites para avaliar o trabalho de seus pares. E meninas se veem como menos brilhantes desde os 6 anos”. Editoria de Ciências – El País
A notíciasaiunoiníciode2017,trazendodadosdeduaspesquisas científicas sobreoalijamentodemulheres do campo de investigações acadêmicas. A reportagem é ilustrada pela foto de divulgação do hollywoodiano "Estrelas além do tempo". Naquele filme, racismo, sexismo, machismo e conservadorismo político se juntam à alta tecnologia beligerante da Guerra Fria. Nada mais representativo do mundo das ciências. O mundo que tem a razão como seu alicerce. A mesma qualidade que sustenta nossas percepções vulgares sobre o comportamento masculino. Homem => razão => civilização => branquitude => ciência => verdade. Equação que não apareceu nos infindos cálculos das protagonistas do filme, mas que definiu calculadamente o silêncio que se instituiria sobre a participação crucial daquelas mulheres na “corrida espacial”.
Mais de meio século separam "Estrelas além do tempo" e a matéria do jornal El País. Neste ínterim, sociedades de matriz ocidental assistiram ao crescimento dos movimentos identitários, dentre estes, o movimento feminista, manifestado em diferentes correntes políticas e de luta, mas com um elemento em comum: contestar o lugar naturalizado de opressão que justificava politicamente a desigualdade entre homens e mulheres. Naquele momento ainda não se falava em gênero como categoria de análise social. Mesmo no campo dos estudos feministas, trabalhava-se muito mais com a categoria “mulher”.
Mais recentemente [...] as feministas começaram a utilizar a palavra “gênero” mais seriamente, no sentido mais literal, como uma maneira de referir-se à organização social da relação entre os sexos [...] Historicizar o uso de um termo com a potência política e contestatória da categoria gênero é importante para que entendamos por que, no presente, estamos assistindo a um recrudescimento conservador que procura realocar no campo da natureza as desigualdades sociais. [...]
Pensar em gênero por esse prisma é ampliar para além do corpo, da anatomia e do biológico as experiências femininas e masculinas, percebendo que construímos nosso gênero de forma relacional, ou seja, nas relações sociais, as quais abarcam as instituições pedagogizantes (família, escola, igrejas), de forma que somos orientadas e orientados pelos valores hegemônicos de cada tempo e lugar, sejam para reiterar esses valores ou para enfrentá-los.
Uma das maneiras de se fazer esses enfrentamentos passa, justamente, pela forma de se construir conhecimento, quer dizer, propor outras maneiras de se pensar o mundo, as relações humanas e, assim, de fazer ciência. Esse lugar assegurado de produção de verdades passa a ser contestado pelos discursos feministas. [...]
O potencial iconoclasta do conceito de gênero se evidencia desde os escritos seminais de Simone de Beauvoir, ainda que ela não tenha se valido dele para denunciar a ciência como um discurso masculinista. Discurso este que construiu “a representação do mundo, como o próprio mundo (…). Eles [os homens] os descrevem do ponto de vista que lhes é peculiar e que confundem com a verdade absoluta”. De forma que esses enunciados, de verdade, legitimaram posições de senso comum que colocam, até o presente, as mulheres como incomensuravelmente distintas dos homens, como seu “outro”, exterior e inferior a eles mesmos. [...]
Os homens criam os mitos da cultura ocidental e, entre estes, está o mito da Mulher, acompanhado também pela mitologia comum das “figuras masculinas convencionais”. Assim, a humanidade é dividida em duas classes, criando-se, como diz Beauvoir, um tipo de “conceito platônico” da noção de Mulher – uma Ideia ou Verdade transcendental imutável: “Assim, à existência dispersa, contingente e múltipla das mulheres, o pensamento mítico opõe o Eterno Feminino único e cristalizado”. Esse mito é fruto de relações de poder e se constrói para servi-las, pois como afirma Beauvoir de forma contundente: “Poucos mitos foram mais vantajosos do que esse para a casta dominante: justifica todos os privilégios e autoriza mesmo abusar deles”.
O que os feminismos, em suas distintas expressões políticas, vêm propondo é altamente desestabilizador do status quo. Se a ciência tem se constituído como o discurso hegemônico do ocidente para propor soluções, articular análises sobre fenômenos diversos e instituir verdades sobre o mundo, entende-se que enfrentar criticamente essas verdades, denunciando seus vícios de origem e suas lacunas silenciadoras, desestabiliza privilégios, mas, mais que isso, exige que desenvolvamos outro vocabulário para falar do presente.
VOCABULÁRIO
Alijamento: exclusão.
Epistemologia: estudo sobre conhecimento científico seus diferentes métodos, suas teorias e práticas; teoria da ciência.
Beligerante: que está em guerra.
Recrudescimento: aumento; intensificação.
Iconoclasta: oposição à tradição.
Status quo: estado vigente; contexto atual.
QUESTÃO 01
IFSUL 2018: A partir da leitura do texto I, conclui-se que:
a) a busca de explicações no campo da natureza demonstra como a noção de gênero tornou-se ultrapassada.
b) os estudos feministas, ao propor a noção de gênero, questionam as verdades construídas e impostas historicamente pela ciência.
c) a situação vivida pelas mulheres durante a Guerra Fria difere-se daquela vivenciada pelas mulheres no século XXI.
d) a ciência deve reafirmar a oposição existente entre homens e mulheres, uma vez que apenas essas categorias podem ser confirmadas biologicamente.
Resposta:
b) os estudos feministas, ao propor a noção de gênero, questionam as verdades construídas e impostas historicamente pela ciência.
Próxima questão:
- Assinale o trecho retirado do texto I que melhor justifica o título “O gênero da ciência ou sobre silêncios e temores em torno de uma epistemologia feminista”.
Texto I
O gênero da ciência ou sobre silêncios e temores em torno de uma epistemologia feminista
“Elas recebem menos convites para avaliar o trabalho de seus pares. E meninas se veem como menos brilhantes desde os 6 anos”. Editoria de Ciências – El País
A notíciasaiunoiníciode2017,trazendodadosdeduaspesquisas científicas sobreoalijamentodemulheres do campo de investigações acadêmicas. A reportagem é ilustrada pela foto de divulgação do hollywoodiano "Estrelas além do tempo". Naquele filme, racismo, sexismo, machismo e conservadorismo político se juntam à alta tecnologia beligerante da Guerra Fria. Nada mais representativo do mundo das ciências. O mundo que tem a razão como seu alicerce. A mesma qualidade que sustenta nossas percepções vulgares sobre o comportamento masculino. Homem => razão => civilização => branquitude => ciência => verdade. Equação que não apareceu nos infindos cálculos das protagonistas do filme, mas que definiu calculadamente o silêncio que se instituiria sobre a participação crucial daquelas mulheres na “corrida espacial”.
Mais de meio século separam "Estrelas além do tempo" e a matéria do jornal El País. Neste ínterim, sociedades de matriz ocidental assistiram ao crescimento dos movimentos identitários, dentre estes, o movimento feminista, manifestado em diferentes correntes políticas e de luta, mas com um elemento em comum: contestar o lugar naturalizado de opressão que justificava politicamente a desigualdade entre homens e mulheres. Naquele momento ainda não se falava em gênero como categoria de análise social. Mesmo no campo dos estudos feministas, trabalhava-se muito mais com a categoria “mulher”.
Mais recentemente [...] as feministas começaram a utilizar a palavra “gênero” mais seriamente, no sentido mais literal, como uma maneira de referir-se à organização social da relação entre os sexos [...] Historicizar o uso de um termo com a potência política e contestatória da categoria gênero é importante para que entendamos por que, no presente, estamos assistindo a um recrudescimento conservador que procura realocar no campo da natureza as desigualdades sociais. [...]
Pensar em gênero por esse prisma é ampliar para além do corpo, da anatomia e do biológico as experiências femininas e masculinas, percebendo que construímos nosso gênero de forma relacional, ou seja, nas relações sociais, as quais abarcam as instituições pedagogizantes (família, escola, igrejas), de forma que somos orientadas e orientados pelos valores hegemônicos de cada tempo e lugar, sejam para reiterar esses valores ou para enfrentá-los.
Uma das maneiras de se fazer esses enfrentamentos passa, justamente, pela forma de se construir conhecimento, quer dizer, propor outras maneiras de se pensar o mundo, as relações humanas e, assim, de fazer ciência. Esse lugar assegurado de produção de verdades passa a ser contestado pelos discursos feministas. [...]
O potencial iconoclasta do conceito de gênero se evidencia desde os escritos seminais de Simone de Beauvoir, ainda que ela não tenha se valido dele para denunciar a ciência como um discurso masculinista. Discurso este que construiu “a representação do mundo, como o próprio mundo (…). Eles [os homens] os descrevem do ponto de vista que lhes é peculiar e que confundem com a verdade absoluta”. De forma que esses enunciados, de verdade, legitimaram posições de senso comum que colocam, até o presente, as mulheres como incomensuravelmente distintas dos homens, como seu “outro”, exterior e inferior a eles mesmos. [...]
Os homens criam os mitos da cultura ocidental e, entre estes, está o mito da Mulher, acompanhado também pela mitologia comum das “figuras masculinas convencionais”. Assim, a humanidade é dividida em duas classes, criando-se, como diz Beauvoir, um tipo de “conceito platônico” da noção de Mulher – uma Ideia ou Verdade transcendental imutável: “Assim, à existência dispersa, contingente e múltipla das mulheres, o pensamento mítico opõe o Eterno Feminino único e cristalizado”. Esse mito é fruto de relações de poder e se constrói para servi-las, pois como afirma Beauvoir de forma contundente: “Poucos mitos foram mais vantajosos do que esse para a casta dominante: justifica todos os privilégios e autoriza mesmo abusar deles”.
O que os feminismos, em suas distintas expressões políticas, vêm propondo é altamente desestabilizador do status quo. Se a ciência tem se constituído como o discurso hegemônico do ocidente para propor soluções, articular análises sobre fenômenos diversos e instituir verdades sobre o mundo, entende-se que enfrentar criticamente essas verdades, denunciando seus vícios de origem e suas lacunas silenciadoras, desestabiliza privilégios, mas, mais que isso, exige que desenvolvamos outro vocabulário para falar do presente.
(Larissa Pelúcio. Revista Comciência, Campinas, n° 185, fev. 2017. Disponível em: <encurtador.com.br/gqvHL>. Acesso em: 01 abr. 2017. Adaptado.)
VOCABULÁRIO
Alijamento: exclusão.
Epistemologia: estudo sobre conhecimento científico seus diferentes métodos, suas teorias e práticas; teoria da ciência.
Beligerante: que está em guerra.
Recrudescimento: aumento; intensificação.
Iconoclasta: oposição à tradição.
Status quo: estado vigente; contexto atual.
Fonte: <http://www.aulete.com.br/>. Acesso em: 02 abr. 2018.
QUESTÃO 01
IFSUL 2018: A partir da leitura do texto I, conclui-se que:
a) a busca de explicações no campo da natureza demonstra como a noção de gênero tornou-se ultrapassada.
b) os estudos feministas, ao propor a noção de gênero, questionam as verdades construídas e impostas historicamente pela ciência.
c) a situação vivida pelas mulheres durante a Guerra Fria difere-se daquela vivenciada pelas mulheres no século XXI.
d) a ciência deve reafirmar a oposição existente entre homens e mulheres, uma vez que apenas essas categorias podem ser confirmadas biologicamente.
Resposta:
b) os estudos feministas, ao propor a noção de gênero, questionam as verdades construídas e impostas historicamente pela ciência.
Próxima questão:
- Assinale o trecho retirado do texto I que melhor justifica o título “O gênero da ciência ou sobre silêncios e temores em torno de uma epistemologia feminista”.
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