Leia o trecho do ensaio “A transitoriedade”, de Sigmund Freud (1856-1939), para responder às questões 29 e 30 . Algum tempo atrás, fiz...
Leia o trecho do ensaio “A transitoriedade”, de Sigmund Freud (1856-1939), para responder às questões 29 e 30.
Algum tempo atrás, fiz um passeio por uma rica paisagem num dia de verão, em companhia de um poeta jovem, mas já famoso. O poeta admirava a beleza do cenário que nos rodeava, porém não se alegrava com ela. Era incomodado pelo pensamento de que toda aquela beleza estava condenada à extinção, pois desapareceria no inverno, e assim também toda a beleza humana e tudo de belo e nobre que os homens criaram ou poderiam criar. Tudo o mais que, de outro modo, ele teria amado e admirado, lhe parecia despojado de valor pela transitoriedade que era o destino de tudo.
Sabemos que tal preocupação com a fragilidade do que é belo e perfeito pode dar origem a duas diferentes tendências na psique. Uma conduz ao doloroso cansaço do mundo mostrado pelo jovem poeta; a outra, à rebelião contra o fato constatado. Não, não é possível que todas essas maravilhas da natureza e da arte, do nosso mundo de sentimentos e do mundo lá fora, venham realmente a se desfazer. Seria uma insensatez e uma blasfêmia acreditar nisso. Essas coisas têm de poder subsistir de alguma forma, subtraídas às influências destruidoras.
Ocorre que essa exigência de imortalidade é tão claramente um produto de nossos desejos que não pode reivindicar valor de realidade. Também o que é doloroso pode ser verdadeiro. Eu não pude me decidir a refutar a transitoriedade universal, nem obter uma exceção para o belo e o perfeito. Mas contestei a visão do poeta pessimista, de que a transitoriedade do belo implica sua desvalorização.
Pelo contrário, significa maior valorização! Valor de transitoriedade é valor de raridade no tempo. A limitação da possibilidade da fruição aumenta a sua preciosidade. É incompreensível, afirmei, que a ideia da transitoriedade do belo deva perturbar a alegria que ele nos proporciona. Quanto à beleza da natureza, ela sempre volta depois que é destruída pelo inverno, e esse retorno bem pode ser considerado eterno, em relação ao nosso tempo de vida. Vemos desaparecer a beleza do rosto e do corpo humanos no curso de nossa vida, mas essa brevidade lhes acrescenta mais um encanto. Se existir uma flor que floresça apenas uma noite, ela não nos parecerá menos formosa por isso. Tampouco posso compreender por que a beleza e a perfeição de uma obra de arte ou de uma realização intelectual deveriam ser depreciadas por sua limitação no tempo. Talvez chegue o dia em que os quadros e estátuas que hoje admiramos se reduzam a pó, ou que nos suceda uma raça de homens que não mais entenda as obras de nossos poetas e pensadores, ou que sobrevenha uma era geológica em que os seres vivos deixem de existir sobre a Terra; mas se o valor de tudo quanto é belo e perfeito é determinado somente por seu significado para a nossa vida emocional, não precisa sobreviver a ela, e portanto independe da duração absoluta.
Algum tempo atrás, fiz um passeio por uma rica paisagem num dia de verão, em companhia de um poeta jovem, mas já famoso. O poeta admirava a beleza do cenário que nos rodeava, porém não se alegrava com ela. Era incomodado pelo pensamento de que toda aquela beleza estava condenada à extinção, pois desapareceria no inverno, e assim também toda a beleza humana e tudo de belo e nobre que os homens criaram ou poderiam criar. Tudo o mais que, de outro modo, ele teria amado e admirado, lhe parecia despojado de valor pela transitoriedade que era o destino de tudo.
Sabemos que tal preocupação com a fragilidade do que é belo e perfeito pode dar origem a duas diferentes tendências na psique. Uma conduz ao doloroso cansaço do mundo mostrado pelo jovem poeta; a outra, à rebelião contra o fato constatado. Não, não é possível que todas essas maravilhas da natureza e da arte, do nosso mundo de sentimentos e do mundo lá fora, venham realmente a se desfazer. Seria uma insensatez e uma blasfêmia acreditar nisso. Essas coisas têm de poder subsistir de alguma forma, subtraídas às influências destruidoras.
Ocorre que essa exigência de imortalidade é tão claramente um produto de nossos desejos que não pode reivindicar valor de realidade. Também o que é doloroso pode ser verdadeiro. Eu não pude me decidir a refutar a transitoriedade universal, nem obter uma exceção para o belo e o perfeito. Mas contestei a visão do poeta pessimista, de que a transitoriedade do belo implica sua desvalorização.
Pelo contrário, significa maior valorização! Valor de transitoriedade é valor de raridade no tempo. A limitação da possibilidade da fruição aumenta a sua preciosidade. É incompreensível, afirmei, que a ideia da transitoriedade do belo deva perturbar a alegria que ele nos proporciona. Quanto à beleza da natureza, ela sempre volta depois que é destruída pelo inverno, e esse retorno bem pode ser considerado eterno, em relação ao nosso tempo de vida. Vemos desaparecer a beleza do rosto e do corpo humanos no curso de nossa vida, mas essa brevidade lhes acrescenta mais um encanto. Se existir uma flor que floresça apenas uma noite, ela não nos parecerá menos formosa por isso. Tampouco posso compreender por que a beleza e a perfeição de uma obra de arte ou de uma realização intelectual deveriam ser depreciadas por sua limitação no tempo. Talvez chegue o dia em que os quadros e estátuas que hoje admiramos se reduzam a pó, ou que nos suceda uma raça de homens que não mais entenda as obras de nossos poetas e pensadores, ou que sobrevenha uma era geológica em que os seres vivos deixem de existir sobre a Terra; mas se o valor de tudo quanto é belo e perfeito é determinado somente por seu significado para a nossa vida emocional, não precisa sobreviver a ela, e portanto independe da duração absoluta.
(Introdução ao narcisismo, 2010. Adaptado.)
QUESTÃO 29
UNESP 2019
a) Explique sucintamente a diferença entre a visão de Freud e a visão do jovem poeta sobre a transitoriedade do belo.
b) Transcreva do segundo parágrafo uma oração em que a ocorrência de vírgula indica a supressão de um verbo. Identifique o verbo suprimido nessa oração.
QUESTÃO ANTERIOR:
- UNESP 2019: Em que verso se verifica um desvio em relação à norma-padrão da língua escrita (mas recorrente na língua oral)?
RESOLUÇÃO:
a) Para o jovem poeta, “a transitoriedade do belo implica sua desvalorização”, o que lhe causa angústia, por considerar que toda a beleza do cenário que admira está condenada à extinção. Para Freud, o fato de a fruição da beleza ser temporal e, logo, finita, traz como consequência a “maior valorização” do que se contempla, uma vez que a efemeridade do belo indica sua “raridade no tempo”, aumentando sua “preciosidade” e, portanto, êxtase na ab sorção.
b) Há omissão de verbo marcada pela vírgula em: a outra, à rebelião contra o fato constatado. A for ma verbal suprimida é “conduz”, presente na oração anterior: Uma conduz ao doloroso cansaço do mundo mostrado pelo jovem poeta. Trata-se de um caso de zeugma.
PRÓXIMA QUESTÃO:
- UNESP 2019: Identifique os referentes dos pronomes sublinhados no primeiro e no quarto parágrafos.
UNESP 2019
a) Explique sucintamente a diferença entre a visão de Freud e a visão do jovem poeta sobre a transitoriedade do belo.
b) Transcreva do segundo parágrafo uma oração em que a ocorrência de vírgula indica a supressão de um verbo. Identifique o verbo suprimido nessa oração.
QUESTÃO ANTERIOR:
- UNESP 2019: Em que verso se verifica um desvio em relação à norma-padrão da língua escrita (mas recorrente na língua oral)?
RESOLUÇÃO:
a) Para o jovem poeta, “a transitoriedade do belo implica sua desvalorização”, o que lhe causa angústia, por considerar que toda a beleza do cenário que admira está condenada à extinção. Para Freud, o fato de a fruição da beleza ser temporal e, logo, finita, traz como consequência a “maior valorização” do que se contempla, uma vez que a efemeridade do belo indica sua “raridade no tempo”, aumentando sua “preciosidade” e, portanto, êxtase na ab sorção.
b) Há omissão de verbo marcada pela vírgula em: a outra, à rebelião contra o fato constatado. A for ma verbal suprimida é “conduz”, presente na oração anterior: Uma conduz ao doloroso cansaço do mundo mostrado pelo jovem poeta. Trata-se de um caso de zeugma.
PRÓXIMA QUESTÃO:
- UNESP 2019: Identifique os referentes dos pronomes sublinhados no primeiro e no quarto parágrafos.
COMENTÁRIOS